Ia a andar e parei no meio do passeio, de repente: uma velhota de vestes pobres, já com alguma dificuldade a mexer-se, remexia na mala gasta. Encontrou e retirou da mala uma carteira que já tinha visto melhores dias. Dessa, retirou uma moeda (não vi qual, mas parece-me que todas lhe fariam grande falta) que entregou, com um sorriso amigável, ao velho pedinte que se lamenta a quem passa naquele lugar.
Com o sorriso, uma frase quiçá mais preciosa: "- Tome lá, senhor André (André? Zé? Tomé? Não tenho a certeza mas acabava em "é"). Hoje não posso dar mais". E seguiu à vida dela.
Ela sabe o nome dele. Eu que ali o vejo todos os dias, eu nem sabia que ele tinha nome. Uma pessoa tem nome, um pedinte é anónimo.
Ela deu o que obviamente lhe faz falta. Eu, a quem nada falta, nunca lhe dei nada.
O homem é muito velho. Não pode ganhar o pão nem ninguém lhe dará essa oportunidade, mesmo que ainda possa fazer qualquer coisa a troco de uma sopa quente, como convém a um Homem.
Tem de o pedir à solidariedade alheia. E esta manifesta-se numa mulher de vestes puídas e limpas, porque os outros, os vestidos de roupa em bom estado, estão com pressa - ainda é hora de expediente.
Voltei a andar; quando passei por ele, o homem não olhava a moeda na mão nem chorava aos passantes. Olhava para ela, ou melhor para as costas dela, com uma expressão indefinível. Fiquei de repente envergonhada, de mim, dos outros, da sociedade, da Vida. De tudo e de todos. Mas não dela, que sabe o nome dele e lhe oferece com um sorriso a bucha da ceia e o reconhecimento da sua condição humana.
Hélas!
Com o sorriso, uma frase quiçá mais preciosa: "- Tome lá, senhor André (André? Zé? Tomé? Não tenho a certeza mas acabava em "é"). Hoje não posso dar mais". E seguiu à vida dela.
Ela sabe o nome dele. Eu que ali o vejo todos os dias, eu nem sabia que ele tinha nome. Uma pessoa tem nome, um pedinte é anónimo.
Ela deu o que obviamente lhe faz falta. Eu, a quem nada falta, nunca lhe dei nada.
O homem é muito velho. Não pode ganhar o pão nem ninguém lhe dará essa oportunidade, mesmo que ainda possa fazer qualquer coisa a troco de uma sopa quente, como convém a um Homem.
Tem de o pedir à solidariedade alheia. E esta manifesta-se numa mulher de vestes puídas e limpas, porque os outros, os vestidos de roupa em bom estado, estão com pressa - ainda é hora de expediente.
Voltei a andar; quando passei por ele, o homem não olhava a moeda na mão nem chorava aos passantes. Olhava para ela, ou melhor para as costas dela, com uma expressão indefinível. Fiquei de repente envergonhada, de mim, dos outros, da sociedade, da Vida. De tudo e de todos. Mas não dela, que sabe o nome dele e lhe oferece com um sorriso a bucha da ceia e o reconhecimento da sua condição humana.
Hélas!