segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Atropelamento sem fuga

Atropelaram-me e nem fugiram, continuaram impávidos e serenos como uma consciência limpa.

Passaram por cima de mim com a mesma tranquilidade com que atravessam a vida, a mesma segurança, a mesma indiferença; acho que nem nunca me viram inteira, quanto mais partida; eu era apenas uma possibilidade de sombra na sua estrada larga e sorridente.

Como sempre, estava escuro e quase ninguém viu o atropelo. Mas houve gente que viu, porque me perguntaram se eu estava bem e se podiam ajudar. Para ser franca, eu não sei se estou bem ou não; mais uma vez, estranhamente, não percebo bem se me apetece rir, brigar, chorar ou esquecer.

Rais partam esta minha natureza, permanentemente desconfiada de mim própria e das minhas certezas. Acho que se nunca ninguém tivesse visto nenhum atropelo, hoje estaria a questionar-me se de facto tinha sido atropelada ou se pelo contrário tinha nascido e vivido sempre assim toda desconjuntada e apenas nunca tinha dado por isso antes.

Batatas. Bom Deus, obrigada pela existência de gente que vê, não tem medo de dizer que viu e que pergunta se pode ajudar.

Hélas!

domingo, 28 de setembro de 2008

O Magalhães

Conhecem o Magalhães? Não, não estou a falar da leitaria ali da esquina, estou a falar do pequeno e escolar PC made in Portugal.

Já recebi e-mails, sms e li nos jornais: o pessoal anda excitadíssimo porque o Sócrates (não, não é o filósofo, estou a falar do actual PM) disse que era um PC português mas afinal os componentes são comprados algures lá fora e Portugal monta as peças para formarem um PC (como todos os fabricantes fazem, hoje em dia).

Acho graça a isto: uma das primeiras marcas a fazer o mesmo - escolher e comprar todos os componentes onde o negócio é melhor, montar e depois por a sua capa e marca, juntamente com um controlo de qualidade excelente, um inteligente modelo financeiro e um marketing eficiente - acho que foi a DELL. O sucesso foi enorme e tornou-se um caso de estudo; hoje não há quem não conheça a DELL.

Ah! Mas sendo Portugal a fazer isto, este sucesso torna-se uma vergonha nacional: onde já se viu Portugal fazer o mesmo que os USA e ainda por cima achar que terá sucesso onde eles também o tiveram, ainda que há já uns anos??...

Que vergonha, que vergonha... Portugal devia ser capaz de fazer o que ninguém faz, andar apenas sobre as águas, chocar diáriamente o mundo com idéias inovadoras como a Brisa e o Multibanco em vez de só o fazer ocasionalmente, e nunca, mas nunca! fazer o que outros já fizeram com sucesso. Sim, porque um milhão de PC made in Portugal no estrangeiro, à vista e uso de todos e espalhando o nome luso pelo menos no país daquela azémola, podem ajudar Portugal tanto financeiramente como em imagem; mas é à custa da auto-estima nacional, que não se satisfaz com nada menor que as Descobertas e trazer novos mundos ao Mundo - não é porreiro, Zé, tá mal.

Hélas!

sábado, 27 de setembro de 2008

S. Teotónio

A culpa é toda de S. Teotónio, porque me habituei a chamar por ele nas horas de incerteza.

Hélas

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Jogos de poder

As palavras são poderosas. Evocam sentimentos e não há nada no mundo mais poderoso que os sentimentos.

Tsunami? Terramoto? Bomba? Deixem-me rir: tudo isso é uma brincadeira de crianças, face às consequências de um sentimento partilhado simultaneamente pelo mesmo número de pessoas que sente directamente esses fenómenos...

Para transformações de importância bíblica não há no mundo nada que se compare com sentimentos partilhados; e certas palavras conseguem essa partilha: "Perdoai-lhes porque eles não sabem o que fazem" tranformou o mundo, "I have a dream" também, embora noutra dimensão.
Acho que do horrível Katrina ninguém se lembrará daqui a uns anos...

Há outras palavras que não o conseguem, "White power" ou "Black power", por exemplo. Acho que é porque não conseguem a partilha necessária e essa é uma das razões que me leva a crer que as pessoas são intrínsecamente boas: as palavras de ódio nunca têm a magia necessária. O ser humano nunca adere completamente ao Mal, apesar de numa altura ou outra sucumbir à tentação.

Hélas!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Destruição criativa

Lembram-se? "Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma" [Lavoisier]

Vem esta a propósito de uma conversa plácida com um amigo que elogiava um texto escrito por um adolescente: entre outras coisas, era equacionada a destruição do branco da página face à criação sobre ele de um texto.

Independentemente de me admirar com a precocidade do adolescente (não li o texto em causa e, embora na idade em que as hormonas andam aos pulos e se pensa principalmente em namoradas, também tem a idade normal para os desesperados problemas existenciais que infernizam essa altura da vida... E não só essa altura, feliz ou infelizmente, sei lá.), ficou-me a pulga atrás do cerebelo.

Fiquei a remoer um pensamento estranho: se a árvore desaparece para se transformar no branco da página, se o branco da página desaparece para dar lugar às palavras, que diabo desaparece para dar lugar ao amor que votamos a quem o temos?...

Só coisas que me ralam.

Hélas!

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Tristeza

Doi-me a alma.

Que fazer, quando alguém a quem amamos está sincera e totalmente convencido de algo que nunca aconteceu? Algo repreensível?

Não há (nunca haverá) prova suficiente para nos convencer que estamos enganados quando o erro é gerado na nossa própria cabeça. Pode-se ver escrito, preto no branco e pela nossa própria mão que a coisa não foi assim mas isso não resolve nada: é que mais depressa se acredita numa conspiração mundial que no engano do nosso próprio cérebro: faz parte da natureza, cujas necessidades de sobrevivência assentam na confiança nos nossos sentidos e na nossa mente...

E a Natureza é sábia porque o contrário seria uma dor insuportável com um suicídio a prazo - não o desejo a ninguém, muito menos a quem amo. As únicas coisas que poderiam ter efeito são conhecimento, confiança e amor; mas a existência desta tríade evitaria a falsa construção mental em primeiro lugar. Feita esta não há solução, acho eu.

Eu sei disto e por isto o amor permanece inteiro - e é por isto que me doi a alma. Por isto e por não ser possível fazer desaparecer a dor alheia - pois, não é só a mim que doi; a quem está enganado, embora esteja enganado, também doi e muito - e a dor é bem real, não tem nada de enganado.

Hélas!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Infância

Não sou daquelas pessoas que julgam que as crianças são seres frágeis; antes pelo contrário, julgo que são mais fortes e resistentes que qualquer adulto - embora ou se calhar por isso mesmo, tenham também muito menos defesas.

Também não sou daquelas pessoas que julgam que um assalto ou um desgosto deixa as crianças traumatizadas para sempre, medrosas e/ou maldosas para o resto da vida; pelo contrário, julgo que as crianças têm uma capacidade de renovação impossível a um adulto cristalizado - embora ou se calhar por isso mesmo, também tenham um espírito crítico muito pouco sofisticado.

Dito isto, há uma coisa que considero verdadeiramentes irrecuperável, qualquer que seja a criança ou o ambiente em que se move, antes, durante ou depois: a leveza de espírito de quem se sente real e incondicionalmente protegido e amado. Perdida uma vez, acho que nunca mais é recuperada essa inocência.

Outras características fantásticas da infância, devidamente acauteladas e nutridas, poderão sobreviver ou mesmo renascer, dando frutos. Mas a verdadeira inocência de quem não concebe o Mal cru, essa nunca se recupera. É como perder um braço: há próteses fantásticas mas nenhuma de compara ao original.

Não sei até que ponto esta inocência infantil é importante no passado de um adulto decente e equilibrado, sei apenas que quanto mais cedo se perde mais cedo se inicia a vida pesada e responsável...

Sim, há perdas definitivas.

Hélas!

domingo, 21 de setembro de 2008

Regresso

Regressei da minha ausência do mundo real. Foi bom.

Contrariamente a hábitos de longa data, ausentei-me deliberada e determinadamente de todo o dia-a-dia, pessoal e profissional. Houve tempo para não pensar em nada além da temperatura do mar ou a beleza duma pedra e tempo para filosofar comigo própria sobre questões dolorosas. Também houve tempo para, sabendo que nada/ninguém é insubstituível, reconhecer que há pessoas e coisas que são muito importantes para mim. Houve tempo para interiorizar novamente a crucial importância das pequenas acções ou da falta delas.

Tomei decisões que tenciono manter vigentes no remoinho agitado da vida normal e espero conseguir manter muito tempo este espírito sereno e sem mágoa. Pelo menos até ao próximo intervalo.

Hélas!

domingo, 7 de setembro de 2008

Olímpicos

Estava aqui a vegetar frente à TV e vi – quando a China quer impressionar o mundo ocidental, tem os meios e a capacidade – de modo que impressiona mesmo. A abertura dos Paralímpicos foi um espectáculo belíssimo, como já tinha sido a abertura dos Olímpicos.

Mas... Não percebo os Paralímpicos, não percebo mesmo…

Se há as categorias de 100, 80 e 50 Kg, qual é a dificuldade de adicionar os sem-uma-perna, sem-um-pé, sem-um-braço ou outra categoria qualquer, qualquer que seja a modalidade? Qual é o problema em ter os 100 m para pessoas que vêem e 100 m para quem não vê?

Porquê este separatismo - uns Jogos para uns, outros Jogos para outros?

Já tive esta discussão com algumas pessoas e é ponto assente que não tenho pinga de sensibilidade para estas coisas. Seja .

Mas há lá discriminação maior que uns jogos especiais, com uma pira olímpica especial, em data especial?... Porque diabos não se consideram os deficientes como são: pessoas normais com um constrangimento qualquer, como não ter 100 kg?… Eu peso 55 e sou altamente pitosga, não me passa pela cabeça competir, num desporto em que isso tenha importância, com alguém que pesa 100kg e tem uma visão 20-20… Se competir quero fazer isso entre iguais ou seja, pessoas em igualdade de circunstâncias onde essas circunstâncias sejam relevantes.

Diga-se de passagem, outra coisa que não percebo de todo é a existência das categorias macho e fêmea no xadrez. Se ao menos a contagem de neurónios fosse diferente em alguma das categorias!...

E com estas me vou por 2 semanas.

Hélas!

sábado, 6 de setembro de 2008

Férias

Vou de férias por 2 semanas, para local onde a Net ainda não está trivializada.

Sei que a publicação anda irresponsavelmente irregular; que bom, pelo menos desta vez posso justificar a ausência de artigos!...


Hélas!