terça-feira, 30 de março de 2010

Leituras


Acabei de ler "Em nome de todos os meus", do Martin Gray (será esse o nome? Não interessa realmente, um homem pode ter muitos nomes).

Fiquei impressionada e já não me acontecia isso há algum tempo.

Não pelas descrições do mal, já as conheço e já chorei com elas; hoje já não choro, estou velha e cínica. Também não com a personagem imparável que faz várias riquezas ao longo da vida, a riqueza, dada ou criada, honesta ou não, não me impressiona.
E - bendita idade - também não me impressiona o seu destino. Há gente que nasce assim, com um T na testa, paciência, é a vida.

O que me impressionou foi a isenção. A capacidade de reconhecer que há homens e bichos e plasticinas entre todos os povos. Sob todas as bandeiras e todas as ideologias, a sua e as dos outros, há homens e bichos e plasticinas e os homens são honestos e respeitam as suas convicções sem nunca deixarem de ser Homens, mau-grado os bichos e as plasticinas e a vida que lhes coube em sorte.

Esta maneira de estar na vida está presente em todo o livro embora não seja mencionada muitas vezes. Com tudo o que viveu e todos os que conheceu, ele sabe e testemunha: há sempre, sempre, homens e bichos e plasticinas, em todo o lado e todas as circunstâncias, sob todas as leis, todas as religiões, todas as educações.

A outra coisa que me impressionou foi a total ausência de auto-comiseração. Quer dizer, o tipo reconhece que sofreu, que teve um quinhão de dores e penas bem grande, ele não é nem estúpido nem ignorante. Mas encara a coisa naturalmente: podia ser ele ou outro qualquer, não é o mundo que o ataca pessoalmente a ele, são as circunstâncias e a sua própria capacidade de sobreviver a elas - se morresse no primeiro infortúnio nunca passaria pelo segundo, não é?
De vez em quando, como toda a gente, vai-se abaixo; mas reconhece o facto como uma fraqueza que é necessário ultrapassar.

Este Martin Gray (será esse o nome? Não interessa, realmente) faz renascer a esperança na raça: há Homens. Este e outros. Ao menos isso, batatas.

Hélas!

segunda-feira, 29 de março de 2010

Fobias


Claustrofobia? Não se visitam grutas.
Enoclofobia? Não se vai a concertos megalómanos.
Vertigens? Não se salta de páraquedas nem se faz body jumping.
É fácil, simples.

Mas...
Quem não consegue fazer uma endoscopia mas precisa dela?
Quem não consegue entrar num elevador com o terror irracional que ele pare mas não tem físico para subir os 15 andares para chegar onde precisa de ir?
Quem não consegue entrar num avião mas tem mesmo de estar em Londres amanhã às 9:00?
Quem entra em stress só de olhar para a máquina do TAC, sem querer saber do botão de pânico para nada, uma vez que este só é útil depois de se estar lá dentro, coisa impensável?
Quem sofre de falta de ar só de imaginar que pode sufocar?
Quem não consegue fazer um RX, no terror de que aquilo o mate devagarinho?

O que deve fazer uma pessoa assim, registrar-se sei lá onde como Portador de Deficiência Maníaca? Vantagens que lhe advirão disso, haverá alguma? Ou serão somente as desvantagens de ser apontado como um def, um tipo indigno de confiança? Haverá uma etiqueta a coser na manga?

Um claro sinal da sua condição é o sorrisinho condescente ou muito entediado/aborrecido dos auxiliares que por acaso tenham de lidar com essa gente.

Aparentemente não são pessoas, são problemas que nem sequer têm a decência de não aparecerem, a estragar a vida de quem trabalha.
São perdas de tempo, chatices inventadas por quem não nos quer bem.
São egoístas decididos a arranjar problemas e sem respeito pelo nosso sossego.
São coisas que não têm direito à existência ou pelo menos à existência à nossa frente, pedindo acção da nossa parte, francamente, a malta está cansada de uma vida de trabalho.
Se calhar deviam ser exterminados. Como as pulgas e outras porcarias incomodativas.

São coisas que me ralam.

Hélas!

sábado, 20 de março de 2010

Casamento


Parece-me que um casamento é um contrato público. Em vez das 2 pessoas envolvidas guardarem para si próprias a sua vida particular, pedem ao Estado que reconheça que estão emparelhadas; em troca, o Estado dá-lhes alguns privilégios civis.

Historicamente este contrato era celebrado com 2 pessoas de sexo oposto por motivos tanto religiosos como práticos (era necessário ter alguma segurança para as crias que andavam pelo mundo; aliás, a religião, em muitas e muitas coisas, foi sempre uma eficaz maneira de obrigar as massas ignaras a terem hábitos saudáveis, como lavar as mãos e tomar conta dos seus dependentes).

Já há muitos anos que nada disto faz sentido: o Estado é laico e toma, melhor ou pior, conta das crianças; a educação básica é obrigatória e as coisas simples como limpar o rabo e tomar banho são impingidas às criancinhas sem apelo ao sobrenatural.

Agora os/as maricas querem não ser excluídas dos tais privilégios civis e regulados pelo Estado. É normal, também os pretos lutaram para se sentar no autocarro, as mulheres lutaram para poder votar, etc, etc, etc - a boa e eterna luta dos excluídos para serem incluídos.

Não compreendo porque é este assunto tão controverso mas também nunca compreendi porque é que os maricas (mais eles que elas) mexem tanto com as pessoas do seu sexo que não são maricas. Por vezes, parece que têm receio que aquilo se lhes pegue... Ou será outro o receio?

Hélas!

domingo, 14 de março de 2010

Até amanhã


Ouvem a rima "Estou aqui" com "Trouxe-te um café"? E nos versos "Bom dia" e "Queres ir dar um volta?", detectam a sublime poesia?
Quem não ouve é duro de ouvido.

Até quando for, que a vida é sempre até quando for... Mas enquanto é, vale a pena, as penas, isso vale. Não é o destino - sempre o mesmo, na realidade - que marca a viagem, é a companhia que marca a viagem, mais o que somos capazes de fazer graças a ela e com ela. Tudo junto é uma coisa espantosa, imparável, um soneto absolutamente único.

Eu sempre disse que quem tem rimas tem tudo.

Hélas!

quinta-feira, 11 de março de 2010

Sorriso

## Publicado automaticamente ##

Vi a cara dele
serenamente feliz
calei o que ia dizer
a vida é tão curta
deixá-lo aproveitar
o momento
amanhã chorará
esta felicidade
quiçá o amanhã
não chega nunca
ao menos
sorriu hoje
genuino sorriso
de felicidade.

Hélas!

segunda-feira, 8 de março de 2010

Intervalo

Caros companheiros de humor e maldizer: estarei off durante a semana, sem acesso a comunicações informáticas.

Publicar artigos é fácil, o dia 11 está assegurado; mas responder a quem comenta ou fazer comentários maldosos aos artigos publicados por outros não acontecerá por impossibilidade física, não estranhem.

Até ao meu regresso.

Hélas!

domingo, 7 de março de 2010

Religião


Eu sou católica.

Uma catolica foleira: não vou à missa, não me confesso a um padre e não comungo há tantos anos que já lhes perdi a conta. Mas sou católica: acredito em Deus, em Cristo e na Igreja Católica, embora consciente que a Igreja é feita de homens, míseros e imperfeitos homens. Não fosse o Espírito Santo e essa estrutura feita de indivíduos fracos, mesquinhos e falsos como somos todos já teria caído - isto é mais uma razão para acreditar do Espírito Santo, realmente.

Lamento muito se desapontei alguém mas é a verdade e a verdade manda Deus que se diga (por acaso eu nunca O ouvi dizer isso mas pronto, como em tantas outras coisas, acredito sem prova).

Olho para outros católicos e não percebo. Baptizam-se, crismam-se, rezam; vão à missa, confessam-se, penitenciam-se, comungam.

Mas quando se trata de por em prática as directrizes que têm, dá-lhes uma confortável amnésia que nem sequer os impede de voltar a rezar nessa mesma noite e pedir a protecção do Deus cujos ensinamentos ignoram.

Fazem-no repetidamente. Prolongam no tempo e na vida os pensamentos, acções e sentimentos contrários à religião que dizem praticar. Julgam. Condenam. Põem o seu próprio bem-estar á frente, na bicha das solicitações da vida. Dizem branco, fazem preto e nem sequer reconhecem a diferença. Não se reconhecem como pecadores ou, pior ainda, reconhecem-se como tal mas não arredam caminho.

Ou muito me engano ou acabei de pecar por falta de misericórdia. Paciência, é mais um numa longuíssima lista. O que me vale é que Deus, ao contrário do Homem, é coerente e perdoará quando eu realmente me arrepender. Hoje não, de certezinha.

É que não percebo, palavra que não. Mas não sou estúpida, o que quer dizer que há aqui algo que não capto, algo de importância fulcral. Que será que me está a escapar?

Hélas!

sábado, 6 de março de 2010

Sentimento


- São rosas, senhor!

E abrindo o avental, permite que caiam no chão todos os espinhos da vida.

Hélas!

quinta-feira, 4 de março de 2010

Realidades virtuais


De repente deu-me uma coisa, assim tipo martelo, acontece.

A gente diz assim e assado, com sorte alguém replica frito e cozido, com azar ninguém diz nada.

Quem diz, bom, desopilou a cachimónia, explanou como pode as suas razões e desencheu o saco. Resultados práticos: zero.
Quem ouviu/leu, bem, divertiu-se, ficou vagamente interessado e a leitura fez passar 5 minutos de tempo morto. Resultados práticos: zero.

Não tenho a certeza mas estou convencida que os resultados não se alteram quando o caixote é de alguém muito público e muito conceituado, tipo Abrupto.

E aqui é que bate o ponto: é mais ou menos consensual que a blogosfera é hoje influente na vida real. Mas será, realmente? Ou o que é influente é apenas o que sempre foi, a opinião influente de alguns? Tresantontem na Radio, anteontem no Jornal, ontem no Jornal e na TV, hoje no Jornal, na TV e na Net - mas sempre os mesmos interlocutores, a servirem-se dos meios disponíveis em cada momento.

Alguém acha, realmente, que as pessoas se informam mais e pensam mais por si próprias?
Ou, como penso, incluir a blogosfera como parceiro interessado e válido é apenas uma visita de feira, beijinhos nos bebés e nas velhotas, ajustada a esse determinado nicho de mercado?

Hélas!

quarta-feira, 3 de março de 2010

Lost in translation


Desde menininha que me conheço este traço: a mania de explicar aos outros que não estão a perceber.

Eu pensava que percebia, que quando alguém dizia à mesa que "o cheiro é muito bom", o tipo que lhe respondia "pois é" na realidade o que tinha ouvido era qualquer coisa do tipo "o cozinheiro é bom" e estava a concordar com isso porque nasceu sem olfacto mas tinha paladar apurado e achava o cozinheiro óptimo.
Eu ouvia um e outro, notava a discrepância de enquadramento e tentava explicar, a um e outro, que estavam a falar de coisas diferentes. Pior ainda, tentava explicar, aos dois, o que o outro tinha dito - os resultados eram em geral desagradáveis, o pessoal saia a rir, melhores amigos, e ambos muito zangados comigo.

Que querem, sempre tive a mania que percebia as diversas linguagens embora seja perfeitamente vulgar em linguas.

Este discurso todo é só para meditarem na necessidade de tradutores. Especialmente da mesma língua - são mais os mal-entendidos na mesma língua que entre linguas diferentes, se calhar porque há tradutores profissionais, pagos, e contratados.
Ou então porque toda a gente pensa que percebe a sua língua mas não lhe custa admitir que não sabe holandês... Sei lá. A verdade é que raramente se percebe o que é dito, e normalmente o que se percebe é o que achamos que o gajo quis dizer. Nem se apercebe a necessidade dos tradutores.

Cada vez os acho mais essenciais, sabem?

Hélas!