domingo, 15 de junho de 2008

Sorriso

Ele sorri sempre.

Tem a sua vida e as suas penas; mas ouve sempre e sempre sorri.

Quando é procurado, exclama, encorajador: "- Olá!" e sorri. E ouve tudo, com ar calmo. A gente diz os ques e porques, aventa hipóteses, angustia-se; procura respostas, explica a possível causa das coisas; ele ouve e sorri, compreensivo, um sorriso doce que nega a solidão. É assim com muita (não toda, acho eu) gente.

Mesmo quando é inquirido, ele nunca nos diz da sua vida, não aventa hipóteses, não se angustia para nós, não explica nem responde; apenas sorri aquele seu sorriso.

Demorou muito tempo antes de eu perceber que ele apenas se protege, afasta-se da montanha russa que são as relações com os outros e, simpático mas prudente, esconde a sua distância nas esquinas do sorrir.

Agora que percebi, já não sou capaz de lhe expor as minhas dúvidas metafísicas, as minhas fragilidades, o mar alto de mim.

Ao fim de um tempo, ele pergunta-me, sorrindo o seu sorriso quente: "Andas zangada comigo?" e eu respondo, também com um sorriso: "- Não!".

E é verdade.

Hélas!

2 comentários:

mac disse...

Marques Correia: Gente...

Hélas!

Marques Correia disse...

Os textos (e os programas) de ficção deviam ter um pontinho para a gente saber que são ficçao.

Nenhum pontinho, indicaria que o texto (ou o programa)não é ficção...

Sem essa (ou outra) convenção, o leitor fica na dúvida (que, afinal, é eterna...)