domingo, 20 de abril de 2008

Discussão

Discutia-se acaloradamente o Estado e o seu dever e direito de retirar crianças a pais desnaturados, drogados, doentes e/ ou brutais (às vezes apenas muito pobres e ignorantes) e colocar as ditas em locais sem condições de humanidade, sem grande vigilância e sem amor.

O assunto é perturbador e reune condições para o incêndio... Os corações vibram, amordaçando a prudência habitual; invisíveis olhos inocentes olham para nós e impedem-nos de executar o habitual balanço entre o que se afirma em voz alta e o que se pensa de facto - as pessoas erguem a voz e defendem isto ou aquilo de peito aberto, e são boas pessoas embora não estejam de acordo.

Alguém diz: "- Bolas! Nunca mais puxo este assunto!"

Fiquei triste. Porque é que várias pessoas, visivelmente boas e decentes todas elas, a debater assim de coração aberto assustam? Porque é que a emoção, livre mas racional, desperta receios de guerras pessoais? É mais enriquecedora uma discussão franca com gente inteligente e que discorda de nós do que uma (des)conversa morna com alguém que concorda com tudo, certo?

O facto de discordarmos acaloradamente de alguém num qualquer assunto não significa que tenhamos esse alguém em fraca conta. Não significa que não sejamos seus amigos e não significa que achemos que só diz asneiras. Não significa guerra. No fim, geralmente fica cada um com a sua mas sabendo a opinião do outro dita por ele próprio; e isso não resulta em tensão e mau ambiente, se estes não existirem já.

Acho eu. Mas devo estar enganada. Aquela reacção é frequente; normalmente quem a tem é uma pessoa boa e preocupada com estes receios.


Hélas!

9 comentários:

Fátima Santos disse...

não conhecera eu o cerne, o contexto, o ambiente nada cálido, nada aconchegante,nada apaziguador de futuros próximos; não o conhecera, e de outro modo seria comentadora, ou nem, ou por sugestão apenas, o que nunca seria o mesmo. Mas conheço. Sei do que fala quando fala em "Alguém diz: - Bolas! Nunca mais puxo este assunto!" ou quando interroga "Porque é que várias pessoas, visivelmente boas e decentes todas elas, a debater assim de coração aberto assustam? "
e não é por acaso que, mais abaixo escreve:"e isso não resulta em tensão e mau ambiente, se estes não existirem já." Coloca a hipótese de que ela possa existir, como sabe que não existe a tensão?! antes?! durante a discussão?! Ou quem entra de peito aberto no debate sabe (tu) as tensões de cada um?! Não sabe, isso garanto. E também diz: " O facto de discordarmos acaloradamente de alguém num qualquer assunto não significa que tenhamos esse alguém em fraca conta. Não significa que não sejamos seus amigos e não significa que achemos que só diz asneiras." e nisto de escrever, cada palavra, cada frase é já um depurado, o que nos é de sim e de contraditório. Ora, como sabe que eu tenho a capacidade de discernir se aquele bando de gente que assim se coloca (eu sei como é!!) degladiando-se que nem uns furiosos, defendendo por vezes o indefensável e sem mais argumentos do que o que acha (eu sei!!) se não encontra em vias de abafar o que eu digo, em vias de mostrar à evidência, nem que seja de mim mesmo,que só digo asneiras e que nunca mais, em local algum, tentarei trazer tal ou tal tema ou outro à discussão, não vá um bando pessoas "boas e decentes" que, também eu!, cuidava gente boa e inteligente, zurzir-me sem dó nem piedade e logo hoje que precisava era de mimos (acontece, sim!!)Repara que retirei o teu "visivelmente" pois quem pode não ver, no meio do debate, sou eu, enfiada na fogueira que terei ateado, às tantas nem me lembro de ter murmurado: e aquela seita de Jesus de todos os dias, o que faziam às crianças.. assim num tom de mágoa ou para dizer (às tantas, às vezes será necessário!!) olhem que eu estou aqui psst
Desses debates e de outros, eu aprendi que há os que não lhe tiram gozo e estão no seu direito, e outros há que cuidam ter estragado o ambiente ou simplesmente precisavam que lhes dessem que nem que fosse uma hipótese de dizer o seu rotundo disparate...
pois cunhada guarde o triste para outras lides
e olhe que mais não digo e nem é porque não pense...
porque tudo na vida se aprende
mas há coisas que nem vale muito a pena e uma delas é essa de perceber que as palavras podem ser agressivas sem o serem. É uma grande ginástica que não devemos exigir ao outro.
( e eu sei do que falo, e ainda mais julgo saber se o escrevo, ou não o faço!)
Por isso, antes do debate defina as regras do jogo
Simples. Depois cada um que tente.
Tenho quase dito...
E olhe que é tema belíssimo de debate: porque será que "Aquela reacção é frequente; normalmente quem a tem é uma pessoa boa e preocupada com estes receios."

mac disse...

mcorreia: Discordo! Ai de mim, discordo acaloradamente!

1º -Quando existe tensão e mau ambiente, não se entra em polémicas de peito aberto - antes se protege no silêncio ou em ditos provocatórios - a diferença é notória, mesmo para os mais despassarados.

2º - Porque diabo confundes alguém que critica a tua posição/opinião com alguém que te está a zurzir, a ti, a tua pessoa, o teu ser?!? Eu acho que estão a zurzir a tua opinião, não a ti!!!
Bem digo eu que ando enganada naquilo que me parece óbvio...

3º - Exijo ao outro tudo aquilo que exijo a mim própria, assim como exijo a mim própria tudo o que vejo o outro a exigir de si... Eu não sou melhor nem pior, se ele consegue eu também consigo, se eu consigo ele também consegue.

4º - Este caso não é jogo, é coração. Por isso é que fico triste...

Hélas!

mac disse...

PS.: Estive a reler e talvez seja relevante um esclarecimento: não fui eu quem lançou a discussão; não fui eu que disse "Bolas!(...)"; e não fui eu que acabei com a discussão.

Pareciam-me irrelevantes estes pormenores; mas podem não ser.

Hèlas!

Anónimo disse...

Pois eu cá acho que é perfeitamente normal,lógico e prevísivel que um debate acalorado e de peito aberto sobre coisas importantes (e quando digo importantes quero dizer que suponham princípios básicos de vida, o bem, o mal e o cinzento assim assim)acabe em tensões que não existiam antes. Isto porque, - e desta vez lá escrevo eu não de peito aberto mas de peito escancarado - se afastarmos o nosso lado Madre Teresa (que existe ou queremos que exista, não sei bem)temos de reconhecer (nem que seja lá bem escondidinho num cantinho mais escuro de nós) que :
1º se o debate for mesmo acalorado;
2º sobre as tais "coisas" mesmo importantes (para nós e a nossa noção do ser e do viver);
3º e a opinião do outro for mesmo muito diferente da nossa;
4 º e não conseguirmos que ele vire de bordo nem que seja um bocadinho ou;
5º que nós não viremos de bordo nem um bocadinho...
...Então, irremediavelmente, depois do debate, do calor e do peito escancarado, a nossa boa opinião do outro ficará "roída", ligeiramente amachucada, talvez um pouco encaracolada, como uma página de um livro depois de vincada. Afinal, é incrível que ele/a, o outro, não tenha visto todos os nossos argumentos, todos os nossos mas, e se, e porque... Depois, claro que, quando gostamos do outro, lá alisamos a página... embora o vinquinho lá fique. Toda a arte consistirá então, para dissipar ou evitar a ressaca das tensões, ou de arranjar novos debates sobre as tais coisas importantes em que no fundo estejamos de acordo ou deixar de debater sobre as tais coisas importantes, e arranjar outros assuntos de debate mais neutros. O problema está que aí por vezes a coisa perde a graça, não é verdade.
É só uma chuvinha para molhar a couve. Bj

mac disse...

Ana: Mmmmhhhhh... Verdade. Sim, verdade verdadeirinha. Esse aspecto estava-me a escapar e explica muito mais satisfatoriamente os esforços apaziguadores.
Agora continuo a não concordar com esses esforços mas por outras razões:
Façamos, para fins de análise, uma distinção entre:
1º - A nossa noção do ser e do viver (branco, preto e 1001 graus de cinzento, mais aquela cor que não percebo bem qual é);
2º - As várias maneiras de aplicar/serem aplicados valores comuns.
Quanto à primeira, nada a fazer; se não partilhamos valores básicos de bem e mal ou de certo e errado, não será uma discussão que vai resolver o conflito; mas 1 discussão franca ajuda sempre, pois ficamos a saber que existe uma incompatibilidade básica que necessita de algo mais do que simples apresentar de factos e argumentos.
A 2ª é muito mais problemática (neste forum). Não é inocente o meu adjectivar de "boas e decentes" as pessoas que discutiam; os adjectivos significam que partilhavam valores de bem e mal comuns (e comuns aos meus, pois fui eu que lhes chamei esses nomes...). A discórdia residia na avaliação das medidas, das suas consequências, etc.
Aí, a discussão parece-me intrínsecamente boa, trazendo aspectos, conceitos e conhecimentos novos a todos os intervenientes; e sendo todos eles malta inteligente e bem formada, não devia haver receio que interpretassem erradamente os argumentos (eu sei que estou errada nisto - a páginas tantas, a malta inteligente e bem formada, quiçá a começar em mim, começa a confundir a crítica aos argumentos com crítica à sua natureza própria - mas ainda não consegui interiorizar isto, estou a trabalhar no assunto :S)
E olha, sim, volta não vira o vinquinho fica lá, mesmo alisado (1º ponto de análise). Mas já lá devia estar antes, só não estava por ignorância. E o conhecimento é sempre - sempre! - melhor que a ignorância: aí sim, a amizade, o amor, a consideração, são reais e conscientes, não pertencem a um mundo de faz-de-conta. Como posso eu gostar de alguém que não conheço? E se depois de conhecer percebo que afinal não gosto, não é isso melhor que a fraude anterior? Para mim e para o outro?
Será que as pessoas que gostam de mim gostam de mim? Ou gostam da idéia que fazem de mim, e ficam zangadas comigo quando percebem que eu não sou essa pessoa?
Bolas, se estou cega e surda, quero saber. Se sou daltónica, quero saber. Se não tenho paladar e afinal as coisa têm sabores diferentes, quero saber. Se as pessoas de quem gosto não existem, quero saber...

Hélas!

Fátima Santos disse...

2º - Porque diabo confundes alguém que critica a tua posição/opinião com alguém que te está a zurzir, a ti, a tua pessoa, o teu ser?!? Eu acho que estão a zurzir a tua opinião, não a ti!!!
e também não percebes que nem toda a gente decente e boa e inteligente, sabe discernir (ou consegue, em dado momento, ou aprendeu...)
se eu consigo ele também consegue. basta que não consiga naquele momento em decorre a discussão (estamos a falar do concreto e não a diletar, é?!)e isso basta para que a reacção seja a que te faz ficar triste (e juro que continuo sem perceber porque é isso te entristece... porque ele/ela se sentem...mal mna discussão? porque não sabem e confundem "alguém que critica a tua posição/opinião com alguém que te está a zurzir, a ti, a tua pessoa, o teu ser?!?" ???)

mac disse...

“(…) e também não percebes que nem toda a gente decente e boa e inteligente, sabe discernir(…)"
Percebo, mas não acredito. Não posso. Não quero. Isso levava-me por maus caminhos. Acredito que as pessoas são em geral subvalorizadas, que na realidade conseguem tudo o que querem, se o quiserem de facto.
Fico triste porque não gosto que a ignorância seja preferida ao conhecimento (ignorância de que não estamos de acordo, de que não temos os mesmos valores, de que existe conflito) e reconhecendo-o como um direito que assiste a qualquer pessoa, entristece-me quando o vejo escolhido.
Hélas!

Anónimo disse...

Cara mia,
Não vais acreditar mas o teu último adubo foi deveras inspirador, e escrevi escrevi... e depois quando quis visualisar perdi toda a escrita. Uma pena. É que estes adubos ao teu assunto têm de facto pano para muitas mangas. Mas não me vem a coragem nem o verbo para reproduzir novamente toda a última inspiração. Assim sendo, sai agora só uma erva daninha... novos adubos virão com outros temas certamente. Uma pena estas partidas que nos pregam as novas tecnologias quando deitamos um olhar de esguelha!

mac disse...

Ana: Pois é, as tecnologias habituam-nos mal, muito mal, eheheh! Isso aconteceu-me uma vez e desde então que tenho outra técnica: a mensagem é escrita no word, copiada para a caixa de comentários e fogo à peça! Quando a coisa corre mal, é so voltar ao word e tornar a copiar...

Hélas!