A falta de pachorra para tolices (ou que nos parecem a nós tolices), a impaciência para com quem não nos compreende nem com explicações, a indisponibilidade para aqueles com quem não temos afinidade (mesmo quando a tivémos no passado), a insensibilidade para ouvir assuntos que nos parecem irrelevantes, bom, tudo isso são maldades.
Magoar os outros normalmente nem é intencional. A impaciência com que lhes cortamos o discurso que não nos interessa não é para os convencer que não têm nada de interessante a dizer e a falta de esforço para os compreender não tem como objectivo a sua tristeza. Pois, não é intencional mas é mau na mesma: analisem bem a coisa e verão que as raízes dessas acções moram no nosso egoísmo e na convicção de que NÓS é que sabemos, NÓS é percebemos, NÓS é que somos donos da verdade, enfim, NÓS é que importamos.
O egoísmo não é o Mal com letra grande mas é certamente um dos seus mais talentosos afilhados. Insidioso, sustentado na Natureza animal do instinto de sobrevivência, dissimulado pela ampla aceitação social, instala-se sem darmos por ele. Muito depressa, estamos a dizer convictamente:
- Se eu não tomar conta de mim, quem tomará? Eu defendo-me, os outros são crescidinhos, que se defendam a si próprios! Se eu não o fizesse era parvo pois ninguém o fará por mim!
E as pessoas à volta concordam. Na verdade, poucas pessoas nesse momento se lembram daqueles que, por uma razão ou por outra, não podem ou não querem defender-se destes pequenos atropelos e que por isso mesmo são sacrificados sem ruído. Que diabo, não se está a falar de matar alguém, não é? O problema é que não se mata ninguém mas mata-se qualquer coisinha; e de coisinha em coisinha, sem nunca o fazer drasticamente, estamos de facto a matar alguém sem dar por nada.
Ser uma expressão do Mal não é fácil, acho eu; mas ser uma expressão do mal é facílimo.
De vez em quando, apercebemo-nos que somos maus, assim, com letra pequenina. Não há nada a fazer quanto a isso, a palavra dita e a pedra atirada nunca voltam para trás; mas é sempre possível tentar ser melhor.
O que eu espero, sinceramente, é não perder nunca a capacidade de me aperceber que sim, ando a ser má com letra pequenina. Que Deus me ajude, porque se perco essa capacidade sabe-se lá onde vou parar.
Hélas!
4 comentários:
a tua sala de estar, Maria: olha-a e pondera quantas maldades tem ela feito...
Ah! e deixa que sorria, apenas sorria, dessa diferença que entendes que existe(tu o dizes!)
poder existir uma bifurcação de um mesmo conceito, quiçá existirem dois, apenas (eu o digo!) porque escreves a palavra com diversa grafia(origens de diferenças entre Palavra e palavra, ele e Ele e outras grafias vindas das igrejas? e no entanto estas apenas diferem o sujeito...Nem é como o emprego da maiúscula em Pátria ou Presidente. É outro o modo como tu, rapariga,empregas a letra: aqui é mesmo o conceito que fica diverso ente o escrever com m pequeno ou com m grande!
Um espanto!
e, como costume, haverá o coitado que, discordando, nunca encontrará modo de ser olhado como sendo um ser que apenas discorda, a não ser que tenha a pachorra de "inventar" (ou ter já inventado e contrapor)uma aberração de iguial calibre; se o não fizer: coitado! quanta " insensibilidade para ouvir assuntos que nos parecem irrelevantes"
maldades, mas apenas maldades com letra pequena de abecedário
irrelevante
nada que o outro não aguente
basta que tenha o mesmo conceito em mente ou outro semelhante
que seja buéda inteligente e humorado e mostre pachorra para pedantes
Maria de Fátima: Não percebo bem o teu comentário, parece-me que misturas o direito de discordar com a falta de pachorra para ouvir coisas em que não estamos minimamente interessados… Parece-me até algo incoerente, uma vez que para discordar é sempre necessário ouvir e tem de nos interessar o suficiente para nos darmos ao trabalho de discordar, acho eu.
Quanto à grafia, não se trata de uma bifurcação nem de dois conceitos distintos, trata-se de grandezas diversas dentro do mesmo conceito - diferença que nunca julguei ser controversa, quanto mais geradora de tamanha zanga…
Acho que nunca me tinham chamado pedante antes.
Hélas!
Maria de Fátima: Cunhada, desculpa, ia ficando incompleta na resposta:
A) A minha sala de estar é igualmente incapaz tanto de maldades como de bondades, pois simplesmente não pertence a esse universo;
B) Obrigada! Um elogio de mestria no uso da palavra escrita, vindo de quem vem é um tesouro para mim.
C) Quando digo que não percebo, é porque não percebo mesmo, não estou a fazer retórica; é que, sabes?, por vezes o teu pensamento a mil é confuso para quem anda mais devagar. Na verdade nunca dei que fosses incoerente, embora muitas vezes não te compreenda...
Hélas!
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