domingo, 31 de outubro de 2010

Demissão


É tão fácil (mas tão fácil mesmo!) a ausência!

Praticamente chama por nós. Basta olhar para o lado, reparar no cão ou nas pedras da calçada e tumba! Lá estamos nós confortavelmente ausentes do que nos pesava tanto e agora nem nos lembramos.
Sim, pesam-nos outros pesos - mas não aquele que nos parte as costas.

Não sei o que pensar disto, certamente que não é saudável uma vida obcecada. Mas também, esquecer um peso sério por mor de 3 dedos de conversa, um bonito por-do-sol ou a complicadice da vida diária... Não me parece saudável tão-pouco.

Talvez o segredo esteja no tempo: será bom esquecer por umas horas, por mais do que isso já não será tão bom, será uma coisa mais tipo demissão.
Por umas horas, quando houver outrém que providencie uma ausência sem nota - de outro modo serão horas roubadas a um mendigo delas.
Isto é tão tortuoso como o Homem - se houver sempre outrém, nós podemos perfeitamente ir curtir para outra freguesia e o outrém que responda às necessidades... Que nós estamos ocupados a ver o por-do-sol e a viver a nossa vidinha.

Esquecendo o outrém, estragamos a nossa vida?!? Talvez. Ou talvez não, talvez estejamos apenas a fazer jus à vida, qualquer vida, vivendo-a inteira: o seu bem e o seu mal.

Afinal, do futuro ninguém sabe mas o presente está aqui agora. O que fizermos hoje será sempre o que podemos fazer sejam quais forem as circunstâncias.

O que não fizermos... Não sei mas a vida nunca volta para trás.

Hélas!

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Cease the day


Tanto insistiram que agora vivo um dia de cada vez - dizem que é assim que somos felizes, que aproveitamos a vida; e eu quero aproveitar a vida e ser feliz.

Então bem, seja.
Um dia de cada vez, o passado não existe e o amanhã não passa de um boato.
Ok. Está adjudicado, deitei fora o calendário.

Agora é que ninguém me convence a fazer nada.

Hélas!

sábado, 23 de outubro de 2010

Paraíso


Gostava de estar numa ilha deserta de um mar quente - eu, o meu homem e um robot a servir caipirinhas e petiscos.
Não para férias, para viver assim mesmo.

Livros aos quilos. Net, obviamente.
De tempos a tempos, um animador mecânico para nos pôr a mexer, sem grande insistência.
Um bailado decente, de quando em vez.
Uma voz especial, de vez em quando.

Nunca hei-de realizar este desejo, isto é só coisas que me ralam.

Hélas!

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Rio


O passado veio de visita mas já se foi embora, é muito bem educado. O futuro virá um dia eventualmente, ainda ando a educá-lo. O presente, esse fica comigo; é de confiança e nunca me falta, quer eu aprecie ou não.

Não sei bem o que quer isto dizer mas os factos falam por si. Quem me dera que falassem a minha língua!

Hélas!

sábado, 16 de outubro de 2010

Nunca digam o que pensam ser verdade


Cheguei a esta brilhante conclusão após horas e horas a meditar na contingência da vida e na lógica da batata.

Não dizer a verdade no geral tem imensas vantagens: a malta fica feliz e disposta a alinhar connosco; ficamos com fama de ser uma pessoa simpatiquíssima, potenciando o desconhecido futuro; evitam-se egos feridos e outras asperezas que dificultam as relações sociais.
E não custa nada: basta dizer aquilo que o outro quer ouvir. É fácil, barato e dá milhões de recompensas.

Já dizer a verdade, por seu turno, é difícil e em geral só dá prejuízo - são escassas as pessoas capazes de lidar com a verdade dos outros; independentemente de gostarmos delas ou não, são raridades. A maioria de nós acarinha a sua verdade e tudo o que não se encaixe perfeitamente nisso é totalmente mentira, uma suja e maldosa mentira com fins inconfessáveis.

O que significa que quando se diz a nossa verdade no país dos outros o mais provável é as fronteiras fecharem-se e sermos declarados persona non grata, sem apelo nem agravo.

São raríssimas as pessoas interessadas na verdade dos outros, mais raras ainda as que compreendem que se trata de uma oferta preciosa (embora necessite de câmbio para a nossa moeda pessoal) e quase inexistentes as que são capazes de fazer esse câmbio tão delicado.

Ainda por cima, dizer a verdade e ouvir a verdade de forma construtiva implica pelo menos duas pessoas que sejam capazes de manter o controlo racional e a objectividade, no país dos sentimentos... E essa raça aparentemente não existe, o que quer dizer que a verdade normalmente é destrutiva, mais valia estar quieto.

Ou, de forma simples: nunca digam a vossa verdade àqueles que estimam, antes aceitem as suas deficiências de forma elegante (há muitos anos, a pessoa mais elegante que alguma vez conheci ensinou-me que não se diz nada quando cheira mal de repente no elevador porque deixaria o culpado desconfortável; a essência da elegância é conseguir que todos os presentes se sintam bem).

Às vezes sou tão lerdinha, batatas. Se este raciocínio vale as horas nele investidas!...

Hélas!

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Passado


Devia saber perfeitamente.
Mas mesmo assim fiquei a ver a filmagem de há 8 anos atrás numa ocasião muito feliz, mas que estupidez! Caramba, estou careca de saber que memórias visuais só com mais de vinte anos...

Éramos todos tão jovens, tão felizes, tão amigos, tão inconscientes do futuro! Olha, que novo estava este há tão pouco tempo, repara que alegre está fulana... Olha, o cicrano, se eu soubesse que afinal o gajo era capaz do que fez agora...

É por estas e outras que não saber o futuro é uma benção. A felicidade daquele dia ninguém ma tira.

Hélas!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Tempo


Quando o tempo se prolonga,

Preguiçoso,
mole,
é.
Mas quando o tempo foge,
diligente,
esguio,
foi.

A diferença absurda
Absolutamente
Incrivelmente
Simplesmente
Semântica,
Enlouquece-me.

Hélas!

domingo, 10 de outubro de 2010

Exactidão


Estamos exactamente a 10-10-10 e são 10:10:10 (da noite).

Depois não digam que eu não avisei.

Hélas!

sábado, 9 de outubro de 2010

Futuro


Estava a ver uma porcaria qualquer na TV, não me apetecia fazer nada além de desligar o cérebro. No fim e em voz off, havia umas considerações filosóficas, daquelas de trazer por casa; desta feita era de que a pessoa sente-se definida pelo seu passado e por isso é que é tão angustiante a amnésia, é como uma amputação de si própria.

Parece ser essencial ao equilíbrio humano ter as suas pessoas, que são suas porque é à vida delas que a pessoa pertence. O não pertencer à vida de ninguém é angustiante, faz o indivíduo sentir que não existe embora esteja fisicamente lá a pensar nisso, igual ao que era antes de perder a memória.
O que simplesmente quer dizer que emocionalmente um indivíduo necessita de saber que a sua existência afectou alguém além dele próprio; esta é uma das razões para ser mau - o que é necessário é afectar, e afectar negativamente é muito mais acessível que afectar positivamente.

Mais interessante é o que a voz off afirmou no fim: quem faz o nosso passado somos nós próprios, a despeito do que quer que seja que nos aconteça. Somos nós, é a nossa reacção aos acontecimentos, que tem importância para o nosso inconsciente, não os acontecimentos em si próprios.
O que quer dizer que maltratar uma criança não tem maior importância que a de forçar a criança a ser formada ao lidar com isso. Já pensaram bem nas implicações deste raciocínio?!? Mete medo na alma mais afoita.

Mas eu acho que a voz off tinha razão. Talvez não a 100% porque há coisas exteriores que quebram uma pessoa, estragam-na sem conserto. Passa a não ser bem uma pessoa, um ser livre. Em vez disso é um aleijado que não pode representar a raça nas olimpíadas de Júpiter. Mas talvez isso fosse exactamente o que eles queriam dizer: há pessoas que conseguem, outras ficam pelo caminho... Mas todos podem alterar esse estado de coisas, a qualquer momento.

Faz todo o sentido sermos definidos pelo nosso passado, uma vez que o nosso passado foi feito por nós. Isto é crucial porque se fizer porcaria hoje, amanhã terei um passado de porcaria... E sendo definida pelo meu passado, serei eu própria uma porcaria.

Ora batatas, para quem queria desligar o cérebro a escolha não foi a melhor. Como será que isto vai afectar o meu futuro?!?

Hélas

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Inconstância divina


S. Pedro chorou lágrimas doces quando as minhas férias chegaram ao fim.

Quando eu me vinha embora daquela terra de ciganos, contrabandistas, algarvios e outra gente de mau porte, havia folhas arrancadas às árvores e a maralha andava curvada, em homenagem. Tal era o seu fungar desgostoso.

Quando cheguei a Lisboa o pranto dos céus não permitiu o normal descarregar da bagagem e por momentos julguei que alguém com asas desceria à terra envolto em luz para me ordenar de viva voz que voltasse para casa, já!

Hoje quando saí para o trabalho, o dia estava frígido de desgosto e as folhas outonais dançavam danças de saudade no chão.

Mas que querem? O amor dos santos é inconstante - à tarde tive de despir o casaco, pois S.Pedro anda a fazer pé de alferes a outrém...


Hélas!

sábado, 2 de outubro de 2010

O outro


Nunca nenhum outro pode ser nós e vice-versa. Ninguém sente as nossas dores como nós, assim como nós somos incapazes de sentir a dor dos outros como ele as sente; as dores dos outros são sempre mais fáceis, mesmo quando reconhecemos que são difíceis e dolorosas. Por vezes até achamos que eles escolheram aquele destino, o que de uma forma tortuosa nos iliba de não nos sentirmos tão mal quanto nós próprios achamos que nos devíamos sentir mas não sentimos...

Quando se desabafa com alguém e se conta o infortúnio, o resultado é sempre igual: quem desabafa tem um alívio temporário mas fica tudo na mesma. É mais ou menos o mesmo que quando se vomita por causa de uma intoxicação alimentar: há um alívio pontual mas depois continuamos tão mal como antes.

Vai daí que aqueles que ajudam mais gente são aqueles que não se identificam com ninguém, solitários na sua alta esfera. São esses que conseguem ajudar o José à 2ª feira, a Maria à 3ª feira, o Manel à 4ª feira, o Jaquim à 5ª e a D.Florípedes à 6ª: ao sábado saem com a família e ao Domingo descansam, como o Senhor.
Qualquer outro ficaria assoberbado só com o José, que precisa de ajuda todos os dias - aliás como os outros todos.

E depois, pergunta-se. Sim, e depois? É melhor ajudar o José todos os dias ou fazer como o altaneiro benfeitor, que ajuda tanta gente? É certo que o José se suicidou numa 5ª feira mas em contra-partida o Jaquim não, nesse dia até se riu com aquela falta de dentes tão cómica.

Eu não faço a mínima ideia, julgam que foi para isso que andei a queimar as pestanas?!? Eu cá estudei electrões e mesmo disso só aprendi que são tímidos.

Hélas!

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Não há direito


Eu sei ler, escrever, contar e falo 2 línguas, o português (língua materna) e linguagem dos gestos, que aprendi no estrangeiro.

Não sou careca. Tenho um olho para ver ao longe e outro para ver ao perto, pelo que não necessito de bengalas oculares apesar de ser um bocado pitosga - têm de concordar que não é qualquer um. Além disso, corto sozinha as unhas dos pés e das mãos, mesmo as da mão direita!

Mantenho este blog e faço comentários noutros, o que é reconhecidamente prova de excelência intelectual e psíquica. Além disso sou fina apreciadora de boa soneca, boa comida, boa bebida e boa companhia.

Como é que uma rapariga tão prendada se vê na iminência do fim das férias de verão, assim de repente e sem apelo nem agravo?

Tenho de ir trabalhar, na próxima segunda-feira?!? Batatas, se eu até sei andar de patins e de bicicleta!

Hélas!