Eu sou do tempo em que o Futebol era o ópio do povo.
O Estado, os Poderes Públicos e os Privados promoviam o Futebol para adormecer nas futilidades clubisticas a racionalidade que poderia tirar o povo, a massa anónima, todos os Joaquins, Antónias, Zés e Marias da mediocridade que lhes era imposta insidiosamente.
Nesse tempo, o Telejornal durava meia hora e os últimos 5 minutos eram dedicados ao desporto rei, com os fantásticos da hora a debitar frases cheias de erros de gramática, de cultura e de razão mas ainda assim capazes de incendiar o coração dos adeptos.
Eu sou do tempo em que o Futebol é religião.
O Estado, os Poderes Públicos e os Privados são promovidos pelo Futebol e fazem gala disso, submissos à vontade do povo que quer que o seu clube ganhe pois a luta, quiçá a vitória, aligeira o trabalho de ganhar o pão e dá sentido aos dias.
O Telejornal hoje dura mais de uma hora. Abre com notícias da bola, passa por uns colarinhos brancos a debitar inanidades, depois umas bombas mas só se se puder ver os mortos ou a família chorosa. A meio - não se pode deixar a audiência desmobilizar - umas bocas dos fantásticos da hora que já não dizem asneiras gramaticais mas continuam inócuos, depois mais uns mortos e outros chorosos e fecham com chave de ouro, os golos de anteontem, ontem e hoje, para rever.
O ópio ganhou. Aliás, as drogas ganham quase sempre.
Não serei do tempo em que o Futebol seja o que é: um passatempo.
Um tempo em que o Telejornal dê a conhecer factos em vez de opiniões e não dê Futebol, que poderá ser apreciado livremente noutro local e com todos os pormenores mas sem dar aqueles ares de notícia ao mesmo nível que um qualquer concurso internacional de invenções bizarras.
Hélas!