Acabei de ler "Em nome de todos os meus", do Martin Gray (será esse o nome? Não interessa realmente, um homem pode ter muitos nomes).
Fiquei impressionada e já não me acontecia isso há algum tempo.
Não pelas descrições do mal, já as conheço e já chorei com elas; hoje já não choro, estou velha e cínica. Também não com a personagem imparável que faz várias riquezas ao longo da vida, a riqueza, dada ou criada, honesta ou não, não me impressiona.
E - bendita idade - também não me impressiona o seu destino. Há gente que nasce assim, com um T na testa, paciência, é a vida.
O que me impressionou foi a isenção. A capacidade de reconhecer que há homens e bichos e plasticinas entre todos os povos. Sob todas as bandeiras e todas as ideologias, a sua e as dos outros, há homens e bichos e plasticinas e os homens são honestos e respeitam as suas convicções sem nunca deixarem de ser Homens, mau-grado os bichos e as plasticinas e a vida que lhes coube em sorte.
Esta maneira de estar na vida está presente em todo o livro embora não seja mencionada muitas vezes. Com tudo o que viveu e todos os que conheceu, ele sabe e testemunha: há sempre, sempre, homens e bichos e plasticinas, em todo o lado e todas as circunstâncias, sob todas as leis, todas as religiões, todas as educações.
A outra coisa que me impressionou foi a total ausência de auto-comiseração. Quer dizer, o tipo reconhece que sofreu, que teve um quinhão de dores e penas bem grande, ele não é nem estúpido nem ignorante. Mas encara a coisa naturalmente: podia ser ele ou outro qualquer, não é o mundo que o ataca pessoalmente a ele, são as circunstâncias e a sua própria capacidade de sobreviver a elas - se morresse no primeiro infortúnio nunca passaria pelo segundo, não é?
De vez em quando, como toda a gente, vai-se abaixo; mas reconhece o facto como uma fraqueza que é necessário ultrapassar.
Este Martin Gray (será esse o nome? Não interessa, realmente) faz renascer a esperança na raça: há Homens. Este e outros. Ao menos isso, batatas.
Hélas!