quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Irritações


Há muitas coisas que me irritam, sou uma rapariga muito irritadiça.

Uma das minhas irritações de estimação são as expressões (e as pessoas que as usam) sobre a suposta queda de valores a que se assiste hoje... Eu tenho péssima memória para datas e nomes mas se puxarem por mim vou à net (maravilhosa invenção) e em 10 minutos saco as mesmas choraminguices e recriminações, só que com datas de há mais de 100 anos e com nomes sonantes (senão nem as conseguia sacar, como é óbvio)...

Bolas, assumam que a vossa tristeza real vem do facto de já não terem 20 anos! E de já não conseguirem acreditar no que acreditavam quando os tinham. E que este simples e incontornável facto vos leva a rezingar com "os jovens" que mais não são para vós que a lembrança dolorosa que já não são o que foram e já não podem o que puderam e já não têm tempo como tiveram.

O que me irritam as considerações "sociais" da malta de hoje! Quando se olha objectivamente para a evolução das considerações sociais de hoje e se comparam com as de ontem, dá-me uma azia contra os meus contemporâneos! Quando vejo gente que, muito a sério, considera que os valores de ontem eram melhores que os de hoje, sobe-me uma coisinha por mim acima.

Apetece-me enviar essa malta toda num foguete temporal que os deposite há 200 anos, com o post-it de "não nobre" na testa. Só para perceberem que afinal não gostam assim tanto dos tais "valores" antigos, especialmente quando um dos seus factores é a quem se aplica.

Irra!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Perdigão que o pensamento / subiu a um alto lugar


Perdigão perdeu a pena, não há mal que lhe não venha

A partir de certa altura na vida, começou a repetir cada vez mais frequentemente esta frase, com um sorriso estranho. Eu encolhia os ombros, sorria também, dizia inanidades do género "Pois é..." sem na realidade compreender aquele sorriso.

Este tempo passado parece-me que compreendo agora, suspeito... A grande tristeza de saber que já não se é capaz, de questionar fora de tempo se foi a escolha certa, o caminho certo, a vida certa; a noção de que é tarde demais, que se esperou tempo demais, que já não vai dar; o desgosto profundo de não ter ninguém com quem realmente partilhar o tempo do medo; a consciência de que - tal como ela própria afirmou a vida inteira - a nossa vida ser em certa medida o que dela fizemos e não gostar da sua vida.

Perdigão perdeu a pena... E já não tem vigor para lutar contra o mal. Não é culpa do perdigão nem do mal que ataca, é simplesmente assim, a condição de já não se ser capaz.

Ela foi o meu símbolo de Humanidade, o meu ideal de luta, a minha ideia de persistência, rigor, amor, integridade e compaixão.
Capaz de discutir política e arte com os especialistas nos intervalos dos croquetes que fritavam, ensinou o português às crianças e a matemática e a filosofia aos adolescentes, aproveitando os intervalos para disseminar saudáveis dúvidas teológicas nos muitos padres que eram visitas de casa; feroz na defesa das suas ideias mas terna com o pássaro caído do ninho e capaz de passar a noite a velar as crias da gata vadia que morreu atropelada.

Claro que não era perfeita, fez tanta asneira na vida!
E a par disso, foi muitas e muitas vezes a imagem de quem faz o que pensa que é certo, custe o que custar e a quem custar. E esta nunca é uma escolha fácil: a quem custa, quando não é o próprio, custa bastante, arde, queima, pois não é escolha sua. Quem paga o preço, se não é quem compra, sente-se abandonado e traído sem remissão.
Esse custo alheio dói muitíssimo a quem escolhe, mesmo quando escolhe o que julga estar certo.

Nunca teve o que queria realmente, o que ela ansiava sem dizer, a sua necessidade verdadeiramente premente: uma irmandade, uma cumplicidade contra o mundo e a natureza das coisas, a compreensão do beco da sua vida.
Eu não percebi na altura certa, tão imersa que estava em coisas triviais e comezinhas...

Espero que estejas finalmente em paz, mãezinha. Desculpa-me o não ter percebido a dimensão do teu desgosto em tempo útil.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Encontro imediato do 1º grau


Será que se eu encontrasse Deus em pessoa no meio da Av. da República e ele me estendesse a mão, eu lha apertava?

Detesto pensar na resposta mais óbvia e mais verdadeira: depende de como Ele estivesse vestido.

Isto é só coisas que me ralam!

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

À deriva


Sei lá que vos dizer, ando pra'qui, é o dentista, a médica, o trabalho, a família, o dia-a-dia, ando pra'qui que nem posso.

Não sei que vos diga, fui no outro dia ao chinês e nem comprei nada, era tudo caro, quer dizer caro não era mas eu não tenho dinheiro para folesterias.

Não sei, que querem, perdi o jeito para as conversas de caca, perdão, de sala. Se vocês quiserem conto a história da menina que foi violada, ou então a do miúdo de 7 anos que foi posto nu à porta de casa para aprender a obedecer aos pais; mas acho que ninguém quer essas histórias, são horríveis.

De resto, sei lá, ando pra'qui que nem posso, no outro dia ouvi sem querer umas conversas de corredor, que horror, era só dizer isto e aquilo deste e da outra. E não consigo perceber como conseguem depois sorrir um maravilhoso sorriso pepsodent a ambos, faz-me mal ao estômago, vou marcar outra consulta que isto não é normal, devo ter um problema digestivo.

Como não tinha companhia para o almoço fui antes dar uma volta, olhem arrependi-me porque a senhora velha que chorava no meio da rua disse-me que não tinha nada, não tinha nada, nada, e aquilo era só nervoso, eu que não ligasse, e eu não tive coragem de lhe dar dinheiro, tive medo de a ofender, rais parta este mundo onde um desejo de ajudar pode ofender também.

Sei lá, isto é tão esquisito, a vida toda, as gentes, vocês não acham?!? Pessoas que riem de dia e de noite choram, as gentes, todas as gentes, meu Deus ajuda aqui que eu já não percebo nada, como é possível esta loucura?!?

Isto é só coisas que me ralam.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Mantra

Não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses, não penses

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

A contingência da Vida

O que eu queria era que não fosse hoje
Podia ser amanhã ou ontem, tanto faz,
Mas que não fosse hoje, nem agora.
Era o que eu queria, se pudesse:
Porque hoje está sol
Um dia luminoso e claro
E eu não sei onde estou
Nem sei para onde vou
Quanto mais por onde vou.
Se não fosse hoje
Eu saberia pela certa
Teria imensas teorias
Que explicariam muito bem
Estar eu onde estivesse.
Com toda a certeza
Se fosse amanhã eu saberia
Porque é que hoje estou aqui
Sem saber onde é aqui;
E se fosse ontem o hoje não existia
E eu não estaria aqui seguramente.


Isto é só coisas que me ralam.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Religiões


Eu não sou uma pessoa culta, já fui e já não sou, de modo que até conheço a diferença.

Mesmo nos meus tempos de pessoa culta, nunca dediquei grande tempo a estudar religiões, sempre me pareceu um bocado desperdício de tempo porque estava - ainda estou - convencida que, no fundo, no fundo, tudo se resume a uma questão de fé e a fé não é racional, embora possa ser racionalmente induzida em outrém.

Mas leio algumas coisas, de quando em vez. E de vez em quando analiso e discuto ideias e dogmas com pessoas de outras religiões.

De cada vez que isso acontece, sai mais reforçada uma convicção muito minha: se alguma vez deixar de ser cristã, só poderei ser ateia. Todas as outras religiões exaltam demasiado o bem estar próprio, com idiotices (na minha douta opinião, claro) do género "se não te amas, não podes amar os outros", ou "se não estiveres de bem contigo, não podes estar de bem com ninguém". Como se, para ajudar alguém, fosse necessário cuidar primeiro de si próprio, como nos dizem para fazer quando caem as máscaras no avião...

Não há nada de errado em cuidar primeiro de si próprio mas, na minha opinião, há algo de muito errado quando se acredita que o Bem é a necessidade dos outros estar sempre depois da nossa. Que temos a obrigação de velar pelo nosso umbigo antes de acudir a outro.

Não sei se isto é apenas uma estratégia para captar crentes (as pessoas, como toda a gente sabe, são egoístas - uma religião ou uma filosofia que lhes diz que isso é bom deve ser muito cativante) mas sei que esta maneira de ver a vida não me convence. Acho sinceramente que o egoísmo (independentemente de eu ser muito egoísta também) não é coisa boa e deve ser combatido.

Pode ser ignorância minha mas só conheço uma religião que diz "esquece-te de ti, os outros devem estar primeiro" e essa é a cristã (católicos, protestantes, etc, aquelas que aceitam Cristo como Deus - acho que os Judeus não exaltam o Eu mas em contrapartida também não incentivam a abnegação pelo nosso semelhante). Todas as outras de que tenho lido, conversado, ouvido, põem o Eu em primeiro lugar.

Só os cristãos reconhecem um louco leproso ou um tipo bera como seu irmão (para o resto da malta em geral é o "outro", um desconhecido sem qualquer relação connosco) e lhe estendem a mão (mesmo a tremer de repulsa!). E se a pessoa não for capaz de lhe estender a mão, terá de ser cristã para se sentir mal por isso - as outras religiões dizem-lhe que "não estava preparada", "que precisa de maior trabalho no seu eu interior", etc, etc, ou seja, que a culpa não é sua.
E é, é sempre escolha nossa.

Além do mais, ou não leram ou não concordam com o poeta que leio e com quem concordo:

"(...)
Contudo a minha mágoa nunca me fez ver negro o que era cor de laranja.
Acima de tudo o mundo externo!
Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim."

Ainda por cima, acho que o gajo era ateu.

Bom 2012, cambada.